À guisa de introdução
Entre os importantes pensadores
do século XIX, destaca-se o francês Émile Durkheim (1858-1917), cujas obras
influenciaram profundamente as Ciências Humanas desde então. Ele é considerado
o principal autor das Ciências Sociais e o fundador da sociologia.
Certo é que sua principal influência
foram as teorias científicas que "explodiram" no século XIX europeu, em especial
nas Ciências Exatas. Em uma de suas obras mais importantes, As Regras do Método Sociológico, Durkheim
propôs a criação de uma categoria nova no âmbito das ciências humanas: os fatos sociais.
Os fatos sociais são, para o autor, um conjunto de realidades que
podem ser pesquisadas de forma similar a de um químico que estuda as substâncias
ou a de um físico que estuda o movimento dos corpos. Clara é a intenção do
autor em buscar a criação de um método de investigação para as Ciências
Humanas, em especial para a Sociologia, que a tornasse aceita no mundo acadêmico
e nas Universidades.
Para Durkheim, os fatos sociais são externos aos indivíduos
e os obrigam a se adaptarem às regras da sociedade onde nasceram e cresceram.
Isso ocorre em função dos princípios fundamentais da socialização dos indivíduos
a partir do seu nascimento. Quais são esses princípios?
Coercitividade: os padrões culturais de uma dada sociedade se impõem
sobre os indivíduos;
Exterioridade: o aprendizado dos indivíduos sobre os padrões de
comportamento individual e social ocorre nos inúmeros planos das suas vidas e a educação formal é somente uma delas;
Generalidade: os fatos sociais nunca são individuais, pois são
construções históricas dos grupos humanos organizados em tribos, comunidades,
nações...
Assim, esse autor destaca o processo de socialização como uma obra
da sociedade, com seus conhecimentos, valores, leis e normas. Ademais, insere a
educação formal como apenas um exemplo sobre como tais conhecimentos, valores, leis e normas são transmitidos para as
novas gerações.
O que fica expresso de forma
clara na proposição de Durkheim é o fato de que a socialização, entendida como
internalização de conhecimentos, valores, leis e normas, está longe de ser
atribuição exclusiva do sistema escolar formal, aliás, criado na Europa no
mesmo século XIX.
Ensino Híbrido
Afirmam José Moran e Lilian
Bacich (2015):
“Híbrido significa misturado, mesclado, blended. A educação sempre foi misturada, híbrida, sempre combinou
vários espaços, tempos, atividades, metodologias, públicos. Agora esse processo,
com a mobilidade e a conectividade, é muito mais perceptível, amplo e profundo:
trata-se de um ecossistema mais aberto e criativo. O ensino também é híbrido,
porque não se reduz ao que planejamos institucionalmente, intencionalmente.
Aprendemos através de processos organizados, junto com processos abertos,
informais. Aprendemos quando estamos com um professor e aprendemos sozinhos,
com colegas, com desconhecidos. Aprendemos intencionalmente e aprendemos
espontaneamente.”
Notável é a semelhança de perspectiva
entre os autores citados: um no já longínquo século XIX e outro no início do
século XXI. A semelhança fundamental é clara e diz respeito às formas pelas
quais os indivíduos “aprendem”, como
está explícito na comparação entre eles.
Muitos antes da existência das
modernas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), as formas híbridas de
aprendizagem já existiam. Poderíamos identificar dezenas de exemplos para
sustentar tal afirmação, desde o aprendizado “de rua” até os constituídos por
saberes, costumes e crenças, passados entre gerações pela tradição oral.
A rigor, a partir do século XV,
com a invenção da imprensa por Gutenberg, inúmeras variáveis da mídia “papel” espalharam
informações e conhecimento por meio de livros, jornais, revistas, diários, cartas,
entre outras. Sim, as sociedades ocidentais se nutriram dessas fontes de
conhecimento que sempre foram mais amplas e abertas do que as da educação
formal.
Devemos nos lembrar, ademais, de que
o denominado conhecimento científico sempre foi “semeado” nos países ocidentais
a partir da construção e circulação das famosas
enciclopédias. Isso já ocorria no século XVIII na França, no qual os
fervorosos defensores do Iluminismo espalhavam todo o conhecimento científico
por meio da Encyclopédie ou Dictionaire
Raisonné des Sciences, des Arts et des Méties. Como afirmam muitos autores,
ela era a Internet da época.
Seguindo a tradição francesa e com
a contribuição dos avanços científicos dos séculos XIX e XX, espalharam-se nos
lares das famílias de classe média no mundo ocidental as famosas Enciclopédias Barsa e a Britannica. Elas foram fonte de pesquisa e conhecimento
para várias gerações, independentemente das ações da educação formal.
Afirmadas essas teses, o que podemos complementar sobre
ensino híbrido no século XXI, senão o óbvio ululante: as metodologias de ensino nos vários níveis da educação formal devem
estar conectadas com os ambientes virtuais criados a partir do início do século
XXI, tanto quanto sempre estiveram conectadas a educação formal e os inúmeros
outros meios de informação e comunicação ao longo da história do mundo
ocidental.
Ambientes virtuais de
aprendizagem, sejam eles quais forem, devem ser usados pelos professores, pelas
escolas em todos os níveis, pois fazem parte da experiência humana do presente
século.
Porém, “não pode se tratar de
usar apenas para afirmar que usa”! Trata-se de incorporar o ensino híbrido levando-se em consideração os próprios
objetivos de aprendizagem, as metodologias elaboradas para alcançar esses
objetivos e a própria construção dos conteúdos escolares, inclusive no
Ensino Básico. O desafio é conhecer os possíveis mecanismos de desenvolvimento cognitivo com uso
dessas tecnologias para acoplá-las ao ensino tradicional em sala de aula.
PIAZZI (2009) afirma que “temos um sistema escolar com milhões de
alunos e quase nenhum estudante”. Isso seria motivado pelo fato de que a
maioria dos alunos estuda para responder as avaliações e não para aprender.
Afirma o autor, baseado em estudos de neurociência,
que os conteúdos vivenciados em sala de aula devem ser objetos de estudos no mesmo
dia, no período posterior às aulas, antes do sono diário. Trata-se aqui do
velho problema de criar o hábito de
estudos em crianças, adolescentes e jovens ou, no caso de escolas em tempo
integral, após as aulas presenciais.
Experiência relatada por Nascimento
e Vieira Jr. (s/d) constata que o uso de uma ferramenta virtual de aprendizagem
colaborativa promoveu a melhoria o aprendizagem de matemática no Ensino Médio
Público no município de Formiga (MG). Tal experiência se deu por meio da
construção de um blog no qual havia interação entre professor e alunos no
contra período escolar. Segundo esses autores:
“Deve-se considerar a importância da aprendizagem colaborativa, associada ao uso das tecnologias, para a promoção da participação efetiva dos alunos. Com os resultados obtidos nesta experiência, espera-se contribuir para que os alunos desenvolvam hábitos de estudo extraclasse mais frequentes e permaneçam contribuindo mutuamente para a aprendizagem coletiva.”
Conclusão
O ensino híbrido promove, assim, a possibilidade de alterar hábitos de estudo (ou de não
estudo) fora da sala de aula, algo
que certamente auxilia no processo de aprendizagem
de qualquer disciplina escolar, além de auxiliar no desenvolvimento das habilidades e competências projetadas
nos projetos pedagógicos.
Trata-se de usar os meios digitais e virtuais para
proporcionar ao alunos a oportunidade de estudar fora do ambiente de
sala de aula em harmônico diálogo
com essa mesma sala de aula.
Bibliografia:
BACICH, Lilian e MORAN, José, 2015. “Aprender
e ensinar com foco na educação híbrida”. Revista
Pátio, nº 25, junho, p. 45-47. Disponível em:
http://www.grupoa.com.br/revistapatio/artigo/11551/aprender-e-ensinar-com-foco-na-educacao-hibrida.aspx
DURKHEIM,
Émile, 1978, As Regras do Método
Sociológico. 9ª edição. São Paulo: Editora Nacional.
MONTENEGRO,
Érica, 2018. “Encyclopédie: a internet do iluminismo”, Revista As Aventuras da História, disponível em https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/historia-encyclopedie-primeira-enciclopedia.phtml,
acesso em 06/06/2020.
NASCIMENTO, D.
L. e VIEIRA JR., N., s/d. “Uma experiência de aprendizagem colaborativa
extraclasse mediada pelo uso da tecnologia.” Revista Educação Pública, disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/5/uma-experiencia-de-aprendizagem-colaborativa-extraclasse-mediada-pelo-uso-da-tecnologia,
acesso em 06/06/2020.
PIAZZI,
Pierluigi, 2009. Ensinando
inteligência: manual de instruções do cérebro do seu aluno. São Paulo:
Aleph.
PIAZZI,
Pierluigi, 2014, Aprendendo
inteligência: manual de instruções do cérebro para estudantes em geral. 3ª
ed. São Paulo: Aleph.
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